A questão da taxa de mortalidade do PMI. O problema é dele mesmo?
- Admin Canal PPP
- 17 de jun. de 2019
- 3 min de leitura
por: Mario Saadi (*)
Nos últimos tempos, críticas diversas têm sido realizadas à utilização do Procedimento de Manifestação de Interesse – PMI. Umas das principais seria a de que haveria pouca conversão de PMIs em editais de licitação e/ou em contratos de concessão ou de Parceria Público-Privada – PPPs.
Dados são dados: em amostragem referente ao exercício de 2015, pesquisa indica que (i) 160 ideias sobre projetos teriam tido PMIs publicados; (ii) 48 teriam chegado à fase de consulta pública; (iii) 42 teriam tido editais de licitação publicados; (iv) 13 contratos teriam sido assinados.[1] A taxa de conversão de PMIs em projetos contratados teria caído historicamente: 83,33% em 2010; 46,88% em 2011; 29,41% em 2012; 8,7% em 2013; 8,47% em 2014; 8,13% em 2015; 2,88% em 2016.[2] Uma das conclusões a que se chega na pesquisa é a de que haveria “baixa qualidade dos projetos e estudos elaborados no âmbito de PMIs”.[3]
Os números assustam, afugentam. Mas, apesar disso, exponho aqui visão bastante singela sobre a questão: a de que a baixa taxa de conversão de ideias sobre projetos em concessões ou PPPs efetivamente contratadas não decorre intrinsicamente do instituto do PMI. Colocar tudo em suas costas é simplificar demais a questão. Ou apostar demais na utilidade do instituto. Nenhuma das duas coisas pode ser feita. As causas são as mais variadas: este é o resumo de meu argumento.
Primeiro, PMIs podem não ser convertidos em projetos pelo simples fato de que os trabalhos apresentados indicariam inviabilidade (ou inconveniência...) de contratação. Esta hipótese não pode ser descartada. Estudos feitos em PMI passam por análises críticas (de quem os faz e de quem os recebe...). A efetiva contratação também passa pelo mesmo. Projeto que se intentou contratar pode não ser viável do ponto de vista ambiental, por exemplo; determinada PPP poderia ser viável apenas com contraprestação pecuniária muito alta (o que poderia não fazer sentido para determinada municipalidade, especialmente quando a utilização dos mesmos recursos é contrastada com outras necessidades que a Administração precisa resolver...).
As causas de inviabilidade e de inconveniência de contratação são inúmeras. Elas precisam ser bem avaliadas na discussão sobre melhorias na estruturação de projetos no país, para que possamos aprender com os erros do passado e garantir que as coisas saiam do papel no futuro.
Falando em melhorias, segundo ponto a ser considerado é o da dificuldade de planejamento de nossa Administração Pública para celebração de contratos de parcerias. Pensamos mais no dia seguinte do que em horizontes de prazo mais alargados; preocupamo-nos mais em apagar incêndios do que com a adoção de medidas de prevenção para que não ocorram.
Trazendo a questão para a infraestrutura, debruçamo-nos mais sobre como viabilizar investimentos em cenários nos quais são discutidos gargalos emergenciais ou quando há necessidade imediata de reaquecimento da economia. Mas nos esquecemos de que a aplicação de recursos deve ser feita antes da demanda (para garantia de que o ativo existirá quando ela chegar...) e que a maturação de projetos que podem gerar impactos econômicos significativos não é simples, tampouco rápida.
A falta de planejamento impactará a conversão de estudos apresentados em PMIs em projetos. O número de projetos infrutíferos aumentará. Doutro lado, a conversão passa pela adoção de medidas variadas, que devem ser igualmente bem desenhadas. Uma delas é a priorização: o que deve ser contratado e quando. Sem clareza sobre o que efetivamente se intenta contratar (qual a política pública de contratação de parcerias de determinado ente federativo, afinal?), os PMIs, naturalmente, fracassarão (como têm fracassado, reforce-se). Mas não só eles: projetos modelados por outros meios terão a mesma fortuna.
Além das mencionadas razões, podem existir outras. O cardápio é grande: discussões institucionais podem inviabilizar a execução dos projetos; debates em audiências e consultas públicas podem expor vertentes até então não imaginadas; projetos podem ser judicializados; editais de licitação podem ser questionados; qualificações econômico-financeiras e técnicas podem ser objeto de controvérsia; a agenda política pode mudar. As motivações para a não execução de projetos são diversas.
Precisamos de bons projetos, de agenda comum para sua viabilização e de pés no chão para seguir adiante. Com PMI ou sem. Ele é apenas meio, ferramenta. Não é fim. Dizer que a taxa de mortalidade de PMIs é alta é apenas constatar que nossa taxa de contratação de projetos é baixa. Não é problema intrínseco ao PMI. A questão é mais ampla: é um problema de cada um de nós.
(*) Sócio de Direito Público e Infraestrutura do Tauil & Chequer associado a Mayer Brown, Doutor em Direito do Estado (USP), Mestre em Direito Administrativo (PUC-SP) e Bacharel em Direito (FGV-SP).
[1] Informações constantes de apresentação denominada “Panorama do Mercado Brasileiro de PPPs”, datada de 22 de maio de 2018 e de propriedade da Radar PPP, slide 15 (disponível em: http://www.sinicesp.org.br/boletins/realizados/2018_05_22_ppp/apresentacao1.pdf. Acesso em: 7 fev. 2019).
[2] Idem, slide 16.
[3] Idem ibidem, slide 20.

